sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A Matriz de Identidade de Moreno - "Corpo-disperso e Corpo-parcial"

Após meu´último texto sobre o espetáculo de Ivaldo Bertazzo (O Corpo Vivo - Carrossel das Espécies), resolvi reler "A Dimensão e o Significado do Corpo no Psicodrama" de Alfredo Naffah Neto - (Editora Agora - 1990). Por sua profundidade, capacidade de fundamentação filosófica e clareza em informar, sem dúvida esse é um dos livros que considero como indispensável para qualquer estudante de psicodrama. Naffah descreve a forma como o psicodrama dimensiona a existência humana: "um grande drama representado por múltiplos atores e cujo enredo lhes é, via de regra, inconsciente." Moreno dizia que: "isso se assemelha a uma peça teatral, onde o diretor escolheu um cenário, um figurino e uma série de cenas brilhantes e sedutoras, representadas por tipos, heróis, máscaras e diálogos sobre a eternidade, a fim de distrair o nosso espírito dos acontecimentos da terra. E assim funcionam milhões de grupos sociais, famílias, escolas, fábricas, igrejas,, nações, etc." Compara esse movimento a uma "sina" que compromete a existência humana a esse entrecruzamento de grupos sociais. A partir dai,  descreve-o como um "ser-em-relação" e como um "ser-no-mundo", recuperando o movimento existencialista de Heidegger.
Pois bem, a visão terapêutica desse movimento procura facilitar para que esses "atores inconscientes", possam descobrir-se como parte do drama, cuja autoria não participaram mas no qual vivem lançados pelo simples fato de existirem - desde o início - no interior das instituições humanas. Drama que se repete por gerações e cuja matriz pode ser encontrada num certo tipo de estrutura sócio-econômica e política, da qual a família se faz representante primeira. O grande palco utilizado por esses "atores inconscientes", é o corpo.. A constituição, transformação e até mesmo a perda desse corpo, se dá através de um processo histórico, descrito por Moreno quando fala sobre o desenvolvimento infantil, como fases da Matriz de Identidade.

Moreno chamou de "corpo-disperso" o corpo do recém-nascido, que ainda está formando o seu "eu". A identidade da criança com o mundo que a rodeia, ainda é total. Não consegue se distinguir da mãe e nem dos objetos que entra em contato. Ainda não percebe seu próprio corpo como sua própria identidade. Concentra-se em ações momentâneas como: mamar, urinar e defecar, existindo tão somente (o corpo) como função fisiológica, ou "papel psicossomático". Este tipo de vivência pela criança, proporciona um "extase existencial". A partir dessas vivências, passa a identificar determinadas zonas corporais e o momento em que entram em funcionamento. Nessa fase o corpo vivido é um "corpo-parcial", sem unidade no tempo e no espaço. Somente após a maturação do sistema nervoso e do reconhecimento que receberá das pessoas que a rodeiam, é que a criança começará, aos poucos, a unificar essas vivências parciais e momentâneas, conquistando uma vivência unitária do próprio corpo. O reconhecimento da criança enquanto um ser singular, está diretamente relacionado a constituição de sua identidade, ou da capacidade da criança em se reconhecer como um "corpo singular", que é capaz de expressar seus próprios anseios e desejos. Nessa fase, embora a criança ainda esteja vivenciando seus momentos de "corpo-disperso e corpo-singular" enquanto papel psicossomático, ela já possui um papel social: o papel de filho, no qual foi lançada desde o primeiro momento de vida, mesmo sem saber. Neste momento da existência da criança, seu destino está atrelado às maiores ou menores possibilidades de sua família. E a transformação e maturação desse corpo, também está diretamente associada aos resultados desse período.
Em minnha próxima postagem continuo com as fases de desenvolvimento.

2 comentários:

  1. Querido Mane,

    Por favor, nao repare nos erros de portugues!

    Esta descrevendo como a identidade desenvolve. Mas, o que eu quero entender melhor e como a identidade desenrole.

    Os momentos de clareza e paz mais profundas se apresentam quando a identidade esta 'ausente' ... ou pelo menos em segundo lugar.

    Na minha experiencia pessoal, o processo de desenvolver auto-consciencia sobre os papeis nao esta me libertando da identidade --- esta me dando a chance de criar papeis novos --- sem duvida esses papeis sao mais bonitos/sutieis/agradaveis etc. mas mesmo assim continuo um ator ... eu acho que e isso que faz a gente sofrer. Todos queremos ser verdadeiros, nao e?

    Um beijo para cada bolso,
    Laura

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  2. Salve Mané!

    achei muito importante ressaltar o aspecto histórico da constituiçäo do indivíduo. Somente pensando assim, podemos encarar que estamos em constante *relaçäo* com as condiçöes histórico-ambientais. E entäo é que vivemos a maravilha de sermos criadores da realidade!

    Um abraço grande

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