terça-feira, 4 de setembro de 2018

Por que perdoar?











O que significa perdoar? Você realmente já perdoou alguém? Você já se perdoou alguma vez? Por que é tão difícil perdoar alguém quando nos sentimos profundamente magoados? Por que é tão difícil se perdoar quando nos arrependemos de uma má decisão ou da falta de alguma decisão? E qual é a importância em se perdoar? Existe algum benefício real em se perdoar? Será que perdoar está exclusivamente relacionado a ficar bem com Deus?
Quando se fala em perdoar imediatamente um link religioso é acionado: "... perdoai-os Senhor... eles não sabem o que fazem..." disse Jesus em seus últimos momentos, diante de um sofrimento brutal. Esta incrível demonstração de desprendimento tornou-se um forte alicerce do catolicismo e inunda o imaginário coletivo até os dias de hoje. Normalmente o ato de perdoar é associado ao exemplo deixado por Jesus para a humanidade. E diante de tamanha demonstração de amor e desprendimento, corremos o risco de ficarmos estagnados. Explico: a ideia de que perdoar, por ser uma tarefa tão difícil e tão improvável, faz com que acreditemos que seja uma tarefa possível somente para Deus.

Mas 
do ponto de vista terapêutico, perdoar é perfeitamente possível e é sobre isso que pretendo tratar aqui. Perdoar é muito importante para a boa saúde mental e emocional, porque está associado a se jogar fora o lixo que alguém ou alguma situação da vida depositou dentro de nós. Significa se livrar de uma sensação extenuante de se estar enxugando gelo, de se estar em looping e refém de sentimentos angustiantes de raiva, impotência e baixa estima. Abrimos espaço interno para recuperar o protagonismo da própria vida. Estes sentimentos angustiantes quando cristalizados, atuam como tumores que drenam a energia da pessoa, impedindo-a de ser espontânea, criativa, produtiva e de tomar decisões mais adequadas na vida. 
Também é preciso esclarecer que perdoar não é nunca para aquele que causou o sofrimento. Perdoar é sempre para aquele que sofre. Não se pode confundir o ato de perdoar com permissividade. Não se trata de simplesmente desculpar alguém que faltou com o respeito, ou foi cruel e agressivo. Também não significa que se deve esquecer algo doloroso que tenha acontecido, nem que não se possa sentir raiva, ou que se deva minimizar um sofrimento muito grande. Lidar adequadamente com a própria raiva e com a dor, fazem parte da saúde e do crescimento emocional. Estes sentimentos ruins podem ser transformados em combustível para mudanças importantes da própria vida. E do ponto de vista fisiológico, perdoar reduz o estresse e diminui muitos sintomas físicos associados, diminui fatores de risco para doenças cardiovasculares e câncer, fortalece o sistema imunológico e reduz significativamente a tensão muscular.

Dependendo da intensidade da mágoa gerada, perdoar torna-se uma tarefa realmente muito difícil e muito dolorosa de se realizar. Quase sempre podemos precisar de ajuda para realizá-la. Qualquer pessoa que se comprometa consigo mesma, até mesmo aquelas que sofreram perdas devastadoras, podem conseguir. Talvez a maior dificuldade em se perdoar esteja relacionada ao sentimento angustiante de impotência e estagnação que experimentamos diante da 
agressividade desmedida, ou simples desconsideração de outras pessoas para conosco. Quando percebemos ausência de culpa e de sinais de preocupação e reparação quando agem mal conosco, nos sentimos estagnados e impotentes. Sentimentos tão angustiantes podem fazer brotar a necessidade do revide, calcados na ilusão de que fazendo sofrer em dobro aquele que me fez sofrer, meu sentimento angustiante de impotência e estagnação irá se dissipar. Na verdade, nesta condição nos tornamos reféns e coadjuvantes dos próprios sentimentos. Presos no looping da angústia onde as ações e desejos dos outros ditarão as regras de como iremos nos sentir. E diante de sentimentos tão ruins, como pensar em perdoar?
Pois bem, perdoar só é possível a partir de uma firme decisão pessoal. O sujeito precisa escolher realmente sair da incômoda condição de coadjuvante, para protagonista da própria vida. Precisa decidir em ser o único responsável pelos próprios sentimentos. Ao fazer isso, tira a responsabilidade sobre seus sentimentos, daquele que lhe fez sofrer - a culpa por como está se sentindo arrasado, não será mais dos outros. Em não sendo mais dos outros,  agora sim pode se responsabilizar e mudar essa condição. E para isso existem técnicas e reflexões terapêuticas que buscam facilitar essa enorme empreitada, aumentando muito a chance de se cumpri-la.