segunda-feira, 7 de outubro de 2019

O equilíbrio necessário - intuição x razão


Equilíbrio psicológico significa reagir psicologicamente de forma adequada e moderada diante de estímulos externos e internos, permitindo um certo autocontrole sobre a vida e também sobre os próprios instintos. A saúde da psique depende basicamente do equilíbrio psicológico. Quando o equilíbrio deixa de existir, o homem entra em colapso tornando-se refém dos acontecimentos externos ou internos. Passa a reagir de forma exagerada diante dos fatos tornando-se extremamente sensível e instável. Tudo parece perder o sentido e o significado. Em tempos difíceis como os de hoje em dia, onde o sentimento de angústia pode ser encontrado em qualquer conversa um pouco mais profunda, o equilíbrio psicológico parece estar ameaçado.   
O sentimento de angústia tem dado o tom maior para boa parte das pessoas. Angústia é uma expressão que tem sua origem no latim e significa: caminho estreito, aflição intensa, agonia, limite de espaço e de tempo. Significado perfeito para estes tempos difíceis e motivos para esse estado emocional pesado parecem não faltar. Começa por termos a sensação de não termos mais tempo para nada. O tempo está passando muito rápido e não conseguimos sequer parar por um instante.  Sem contar que a convivência no mundo atual está recheada de extrema violência, com muitos conflitos, mentiras (fake news), desorientação, doenças novas e assustadoras, doenças velhas que estavam praticamente extintas e estão ressurgindo, falta de oportunidades, intolerância e brutalidade. Parece que o valor pela vida e pelo ser humano desceu significativamente a régua, ou se foi para sempre. Atitudes e comportamentos inacreditáveis nos fazem crer que as portas do esgoto subterrâneo da psique humana estão escancaradas. O homem civilizado está sendo colocado à prova e a sensação desesperadora que temos, é que ele está perdendo feio. A saúde da psique que já possui uma fragilidade genuína, diante de cenários macro tão difíceis demonstra estar acusando o golpe. Perda de sentido na vida, explosões de raiva, descontrole, depressão, transtornos de ansiedade e uma importante fragmentação da identidade tem sido sintomas muito comuns. Minha experiência profissional tem confirmado essa impressão, infelizmente.

A psique diante das adversidades tende ao desequilíbrio, mas precisa fundamentalmente dele para não adoecermos gravemente. Um equilíbrio que combine os fatores externos e objetivos, com os fatores internos e subjetivos: consciência inconsciente trabalhando juntos para a produção do "sentido" e da "significação" da vida e de si próprio. De forma natural consciência inconsciente dependem simbioticamente um do outro. Não é possível um estar bem se o outro não estiver. Mas a consciência do homem moderno e sua relação com o inconsciente, parece estar doente e sem conexão, cada vez mais desprovida de "significação"
Se o cenário interno não estiver bom, claro que o cenário externo também não estará. Não podemos esquecer que a forma como enxergamos o mundo e a vida, são projeções de nossa mente: ("Não vemos as coisas como elas são, nós vemos as coisas como nós somos! - Anaís Nin"). Esses argumentos me fazem crer que talvez uma boa maneira de melhorarmos esse mundo difícil e caótico, seria primeiro melhorando nosso mundo interno. E como podemos fazer isso? Talvez seja prestando mais atenção na riqueza do mundo interno, restabelecendo uma boa conexão entre consciência inconsciente e permitindo que a criatividade traga soluções genuínas e transformadoras para a vida.
Permitir-se experimentar conscientemente sentimentos, sentidos e intuições. Quando ressalto "experimentar conscientemente", me refiro ao fato da intuição e dos sentidos pertencerem ao mundo inconsciente, e não fazerem parte da consciência, que naturalmente costuma rejeitar as mensagens sempre cifradas enviadas pelo inconsciente. A consciência do homem moderno por utilizar normalmente a lógica e a razão, tende a ignorar essas mensagens cifradas através de sonhos, impressões e intuições. Combinada com os conteúdos inconscientes, a percepção da realidade objetiva e externa aumenta significativamente porque aumenta-se a quantidade e a qualidade dos sentidos, aumentando e fortalecendo a consciência. A intuição poderá espontânea e criativamente trazer luz para aquilo que se está observando conscientemente e que parece não ter saída. A espontaneidade e a criatividade surgem do mundo inconsciente, trazendo respostas novas para questões antigas. Aumentando a sua percepção da realidade, o homem saberá como se posicionar e se adaptar equilibradamente diante das dificuldades e das facilidades.
Como dizia Gilberto Gil em sua linda canção: "A luz nasce na escuridão".

Mas infelizmente, olhar para dentro de si parece não ter nenhuma validade ou importância para a maior parte das pessoas. Nos acostumamos a apenas "pensar" para organizar intelectualmente aquilo que percebemos sensorialmente (5 sentidos) sobre as experiências da vida. Provavelmente isso esteja relacionado com o medo recorrente que o homem tem do novo e daquilo que provocará mudanças onde aparentemente ele perderá o controle. E uma forma de se proteger desse medo é ignorar tudo o que não pareça ser racional e intelectualmente lógico. A lógica racional nos faz crer erroneamente, que estamos no controle. O conteúdo inconsciente é sempre simbólico, mítico e consequentemente mais assustador. Suas mensagens são sempre cifradas. Sonhar, meditar, dançar, fazer mantras, ouvir música, observar telas de arte, esculturas, ler poemas, contemplar a natureza, são maneiras e atividades que podem facilitar esse contato. A linguagem dos sonhos é um bom exemplo da forma simbólica como o inconsciente se comunica. Observar os próprios sonhos e utilizá-los como forma de meditação, inspiração e motivação para a mudança. A psicologia Jungiana se utiliza da "imaginação ativa" como uma importante forma de transcendência e autoconhecimento. Jung foi o precursor deste método e o utilizou para estimular pacientes psiquiátricos a extravasarem fantasias inconscientes e conscientes e exercitarem a espontaneidade e criatividade através das artes. Este assunto tem me fascinado ultimamente e pretendo discorrer mais sobre ele futuramente. 
Mas neste mundo corrido, ao invés disso a maior parte das pessoas está aprisionada pela tecnologia. O homem moderno dedica mais tempo para a tecnologia do que para si mesmo. Passou a confiar quase que cegamente na tecnologia para resolver todos os problemas do seu dia a dia. Curiosamente, na medida em que o conhecimento tecnológico aumenta sua abrangência e capacidade em propor novas soluções, diminui-se na mesma ou maior proporção o grau de humanização. Estamos isolados diante de uma tela, praticamente impossibilitados de exercitar a empatia. Para se humanizar é preciso entrar em contato profundo com a própria humanidade e compartilhá-la através de nossas ações práticas e objetivas na vida cotidiana.
Volto a escrever mais sobre a riqueza do inconsciente e na importância da sua conexão com a consciência, como forma de preservá-la saudável, maior e menos frágil.