O que esperar do papel do psicólogo(a) e onde localizar a
fronteira que delimita seu campo de atuação? O que se espera que o psicólogo(a)
faça quando precisar atuar em situações complexas como por exemplo: o
sofrimento psíquico de alguém exigir cuidados psiquiátricos além da
psicoterapia processual, ou a necessidade de aplicação de testes projetivos ou
psicométricos, ou compreender a personalidade e seu conjunto de possibilidades,
ou identificar e estudar comportamentos, ou selecionar perfis específicos para
trabalhos específicos, etc.? A resposta principal e mais importante: na prática
a psicologia está focada em aliviar o sofrimento psíquico de seu cliente.
Algumas vezes o psicodiagnóstico é o ponto de partida para qualquer ação ou
intervenção, diante do problema que se apresenta. O psicodiagnóstico é a
tentativa de organizar as informações que se apresentam através do cliente,
utilizando-se dos vários conhecimentos e teorias que compõe o estudo
psicológico, com o único objetivo e finalidade de ajudá-lo. O diagnóstico
psicológico praticado pelo psicólogo, como outros tipos de diagnóstico
determinados por outras ciências, deve atender a objetivos já definidos
teoricamente, de acordo com a sua linha de trabalho. Ao mesmo tempo, essa
prática constante permite que esses conhecimentos e teorias já determinados
previamente, sejam validados ou até mesmo, modificados, num movimento que
aumenta a possibilidade de compreensão de um determinado fenômeno. Essa é uma
velha questão entre teoria e prática que ocorre em todas as ciências: uma não
sobrevive sem a outra - uma alimenta a outra. A prática clínica diária é o que
tem impulsionado o desenvolvimento de novos modelos de psicodiagnóstico,
forçando a melhor compreensão ou modificação de conceitos e teorias que já estavam
previamente estabelecidos.
Diagnóstico vem do
grego diagnõstikós - que tem o significado de: discernimento
ou faculdade de conhecer ou ver através de. Mas trata-se de um conhecer e
de um ver, que procura ir além daquilo que o senso comum já conhece.
E para se "ir além", é necessário se fazer uso de
conceitos e teorias filosóficas ou científicas, que sempre variam conforme o
tipo de compreensão que se queira ter acerca de algum fenômeno. O caminho para
este conhecimento é percorrido através de processos e observações, que geram
avaliações e interpretações. E o curioso é que toda avaliação e interpretação,
sempre está vinculada e à serviço de uma forma de se ver o mundo, de se pensar
e de se estruturar conceitos e teorias. Sim, existem várias formas de se ver o
mundo e de se construir teorias. Um mesmo fenômeno pode ser observado por
vários tipos e formas de se pensar, gerando teorias, compreensões e atuações
distintas. Um bom exemplo que é muito comum: pessoas que procuram pela medicina
homeopática para se tratar de algum problema, certamente teriam uma compreensão
e um método de atuação muito diferentes, se procurassem pela medicina alopática
ou pela medicina antroposófica para tratar do mesmo problema.
Por ser muito ampla
e vasta, a própria psicologia possui dentro de seu campo conceitual e de
atuação, muitas formas diferentes de se pensar e construir teorias e
conhecimentos. Essa multiplicidade de informações pode as vezes acabar
reforçando uma certa confusão de papeis e de campos de atuação que vou procurar
esclarecer minimamente. Talvez isso se explique pelo fato da psicologia estar
inserida no conjunto das ciências humanas, que buscam compreender qualquer
fenômeno humano. Os fenômenos humanos são muito complexos e a busca por dados e
informações, pode exigir o uso de informações de outras fontes e ciências. Ao
mesmo tempo, fenômenos humanos também podem e são estudados por outras
ciências. Mas embora possa fazer uso de dados de outras ciências, as funções do
psicólogo devem sempre estar se referindo aos fenômenos humanos, abrangidos
pela psicologia. A psicologia é composta por vários tipos de conhecimento,
teorias e modos de pensar, que produzem técnicas e compreensões específicas e
distintas. E esses conhecimentos e métodos é que irão determinar o campo de
atuação e competência do psicólogo(a).
A preocupação com o
psicodiagnóstico surgiu desde que as doenças mentais passaram a ser
consideradas como doenças e distúrbios passíveis de serem estudados e tratados
(por volta do final do Séc.XIX), e não mais como possessões ou punições
divinas. Desde então, a psicologia clínica passou a observá-las, descrevê-las e
classificá-las. A psicologia clínica se iniciou e se desenvolveu através do
ramo da medicina voltado para o estudo das doenças mentais: a psiquiatria.
Foram os médicos os primeiros a se preocuparem com a saúde mental e a fundarem
a psicologia clínica. Diferente da psicologia, a medicina está inserida no
campo das ciências naturais. O modelo médico inicial enfatizava os aspectos
patológicos do indivíduo, nosologia (ramo da medicina que estuda e classifica
as doenças...) e fazia uso de instrumentos que pudessem medir as
características do indivíduo. Essas foram as fundações para o surgimento
dos testes psicométricos que visam determinar da capacidade
intelectual, aptidões e dificuldades cognitivas enfrentadas pelo indivíduo.
Hoje em dia são muito utilizados para fornecer orientação para pais,
professores, médicos, instituições, psicólogos, etc.
Nesta esteira também
surgiu o modelo comportamental, que observa o fenômeno humano
através do comportamento, preocupando-se em determinar as leis que o regem e as
variáveis que o influenciam. Sua ação preocupa-se em poder agir sobre ele,
mantendo-o, substituindo-o ou modelando-o.
Em outras palavras o
modelo médico se baseou nas ciências naturais para compreender os fenômenos humanos,
considerando que assim poderia observar, medir e classificar.
No início do Séc.XX
surgem as novas escolas que passam a encarar o psicodiagnóstico de maneira
diferente, levando em conta a subjetividade humana. Ao
contrário do comportamento ou de testes que possam ser medidos, a subjetividade humana
como o próprio nome diz, não pode ser objetiva. Cada indivíduo é singular em
sua subjetividade. Para estas escolas não é possível avaliar os fenômenos
humanos através de regras gerais, que servem para se observar os fenômenos
observáveis da natureza. Outra diferença crucial está no fato destas escolas
considerarem impossível se separar ou haver algum tipo de isenção, entre o
observador (aquele que está estudando o fenômeno humano), e o objeto que se
está observando (o indivíduo e sua subjetividade). Considera que o observador também é
humano e também possui subjetividade. Portanto, enquanto observa e cria
teorias, não pode negar a participação de sua subjetividade neste processo.
Este novo pensamento sobre os fenômenos humanos se originou na filosofia, que
considerava que todo o conhecimento existente havia sido estabelecido pelo
homem, e por isso mesmo, com a participação de toda a sua subjetividade. E
assim ficou claro que os métodos objetivos das ciências naturais onde o modelo
médico se baseava, não poderiam ser transpostos para as ciências humanas.
As principais
escolas que surgiram passaram a criar novas teorias e novas formas de
atuação. A escola humanista passa a considerar o
psicodiagnóstico um reducionismo e passa a criticá-lo em seu aspecto
classificatório. Considerava que se tratavam de racionalizações baseadas em
julgamentos que desprezavam o aspecto humano. Já a escola
fenomenológico-existencial considerava que a dados obtidos por
entrevistas ou em testes poderiam sim ser úteis para o processo de
psicoterapia, ajudando as pessoas no caminho do autoconhecimento. Mas um
caminho a ser percorrido e mediado entre o psicólogo e seu cliente, onde o
resultado final ainda estava em construção. A escola psicanalítica surge
e revoluciona a psicologia. Ela introduz o conceito de inconsciente e
se preocupa em estudar os processos intrapsíquicos, a dinâmica da
personalidade, os comportamentos psicopatológicos, sua origem e prognóstico.
Cria-se uma nova teoria que passa a valorizar as entrevistas como instrumento
de trabalho, a criação de testes projetivos (testes
baseados na hipótese projetiva: ao procurar organizar uma informação ambígua, o
indivíduo projeta aspectos de sua própria personalidade), e a relação entre
o psicólogo(a) e seu cliente. Assim a psicanálise criou instrumentos sutis e
poderosos para observar o que se passa com o indivíduo, por detrás de seu
comportamento aparente.
Seja qual for o
modelo acima seguido pelo psicólogo(a), ele estará atuando dentro do campo da
psicologia, cujo maior objetivo é compreender seu cliente a fim de ajudá-lo.
Acho que entendi um pouco mais e me sinto mais confortável em saber que não acontece só comigo. Tive muita raiva de minha psicóloga quando me disse que eu precisava também de um psiquiatra. Abandonei o tratamento.
ResponderExcluirEssa confusão de de teorias é boa para os pacientes? Quem devo procurar primeiro? O psiquiatra ou o psicólogo?
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