sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Insônia Crônica 1 - Epidemiologia, impacto sócio-econômico e diagnóstico

Aceitei prontamente as boas críticas que recebi recentemente, me solicitando que postasse textos mais enxutos, mas sem o prejuízo da profundidade dos temas. Escrever aqui está sendo uma experiência muito construtiva e de um aprendizado enorme. Vou procurar por em prática esse novo método, escrevendo  sobre a insônia crônica através de várias postagens, em funão da enorme complexidade do assunto. Nesse primeiro texto da série, pretendo falar sobre a epidemiologia, impacto sócio-econômico da insônia e da dificuldade da prática clínica em investigar, definir seus sintomas e proporcionar tratamento adequado.

Já dissemos aqui que a insônia é definida como "a percepção de sono insuficiente, motivada pela incapacidade que o indivíduo tem em iniciar e manter o sono". Outros sintomas baseados no sono e em queixas diurnas, também ajudam a determinar quadros de insônia, como: sono não restaurador, despertares que acabam se antecipando cada vez mais do horário de acordar, sonolência excessiva diurna, fadiga, dificuldades cognitivas, prejuízos funcionais e operacionais, alterações drásticas de humor, etc.  Sua prevalência (percentual da quantidade de pessoas afetadas na população geral) estimada de maneira muito modesta, oscila entre 4,4% e  11,7%. Segundo os especialistas, a prevalência da insônia é muito difícil de ser estimada em função de haver muitas variações entre os estudos até então realizados. Variações sócio-culturais e geográficas, que acabam dificultando a elaboração de um critério mais claro para a definição e classificação da insônia, sua freqüência e severidade de sintomas.  De qualquer forma, estudos sugerem que a insônia crônica seja mais presente no mundo ocidental e que mulheres e pessoas com idade avançada tenham uma maior propenção em apresentar esse quadro.

Não é difícil imaginar que uma pessoa que não tenha dormido adequadamente possa enfrentar muitas dificuldades em sua vida cotidiana. Acidentes de trânsito, domésticos e de trabalho, aumento da ansiedade e pânico, depressão, abuso de substâncias, diminuição do vigor físico, problemas de relacionamento, problemas cardíacos, etc. Todos esses sintomas podem estar relacionados com a insônia. Obviamente há um impacto social e econômico significativo, se levarmos em conta o percentual de prevalência da insônia. Uma avaliação desse impacto realizada nos EUA (Stoller -1994), estimou um custo social /ano de mais de U$ 92 bilhões. Essa estimativa levou em consideração o fato de que insones procuram mais os serviços médicos psiquiátricos, faltam mais ao trabalho, e aumentam significativamente os custos da saúde pública, relativos ao tratamento. O mais interessante é que estudos realizados nos EUA revelaram que apesar dos altos custos, uma proporção substancial de insones, não é tratada - Gallup (1991) - somente 5% de insones procuraram por ajuda médica ou psicológica. Minha intenção aqui não é discorrer sobre o custo econômico da insônia, mas me valer desses dados para demonstrar a sua importância nos dias de hoje. Isso quer dizer que a insônia é muito mais comum e prevalente, do que imaginamos.

Por outro lado, verificou-se através desses estudos que a prática clínica encontra dificuldades em definir os sintomas da insônia, tendo a urgente necessidade de uma boa revisão dos métodos de investigação clínica. Por sua origem muiltifatorial e com conseqüências em diversos níveis (psiquiátricos, psicológicos, biológicos, e sociais) , a insônia exige a realização de um diagnóstico diferencial para ser bem diagnosticada e tratada. É muito comum eu atender pessoas com diagnóstico de insônia, que já passaram por vários tratamentos sem uma eficiência significativa. Atendi casos em que o paciente apresentava queixas iniciais de depressão e de distúrbios do humor, que na verdade eram sintomas secundários à insônia e vie-e-versa. Em outros atendimentos, tive pacientes que eram tidos como insones, mas na verdade possuiam outros distúrbios do sono, como apnéia ou SPI (Síndrome das Pernas Inquietas). Hábitos sociais incompatíveis e uma má higiene do sono também são processos iniciadores da insônia. Uma vez identificados e tratados, podem resolver o problema, sem a necessidade de auxílio farmacológico. Infelizmente, o que podemos observar no dia-a-dia é a forte tendência das pessoas se auto-medicarem, quase sempre de maneira inadequada, ao invés de procurar por ajuda especializada.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Psicodrama e Psicoterapia de Grupo

Muitas pessoas que me são indicadas para fazer psicoterapia sentem-se receosas e estranham quando digo que sou psicodramatista e que, embora não seja uma regra, sempre que possível e adequado, procure encaixar o cliente em algum grupo de terapia já existente. Normalmente as perguntas são sobre como funcionam as sessões, se terão que desenvolver dotes artísticos, se serão obrigados a realizar performances, se terão a obrigação de "se abrir" além do necessário com os outros integrantes do grupo, etc. Esses receios se não forem adequadamente esclarecidos, podem acabar afastando o sujeito da ajuda que veio buscar. Nesse texto procurei organizar alguns conceitos de maneira simples e direta, numa tentativa de dar respostas a estas questões. Ressalto que são questões muito procedentes, que atormentam as pessoas que não conhecem psicodrama e atividades terapêuticas com grupos (a grande maioria...). A tarefa de responder e esclarecer não é nada fácil. Por trás dessas dúvidas e receios há um universo de informações teóricas, filosóficas e práticas, que embora não percebamos, influenciam nossos hábitos, decisões, comportamentos e modos de ver a vida. Inicialmente considero que vale a pena contar um pouquinho da história do psicodrama,  a forma como ele se desenvolve nos atendimentos e também apresentar exemplos de sua efetividade.
PSICODRAMA
Na definição de Jabob Levy Moreno (o criador do psicodrama), psicodrama “é a ciência que explora a "verdade" por métodos dramáticos" (entenda-se por "verdade", como a "verdade" que alguém está vivenciando ou procurando vivenciar, ou seja, a "verdade" subjetiva). Fala-se em métodos "dramáticos", porque o teatro é o berço do psicodrama. Na década de 1920, logo após a primeira grande guerra mundial, Moreno vivia em Viena. Já era médico formado e mantinha uma intensa atividade com trabalhos de prevenção e acolhimento, em comunidades de refugiados e prostitutas. Mantinha uma relação muito especial com o teatro porque considerava que o teatro tinha possibilidades ilimitadas para a investigação da "espontaneidade e criatividade”. Esses são conceitos básicos do psicodrama: "A espontaneidade é a capacidade de agir de modo adequado diante de situações novas, criando uma resposta inédita ou renovadora ou, ainda, transformadora de situações pré-estabelecidas". Ou seja, isso significa que o sujeito espontâneo e criativo possui o prazer e a alegria de estar vivo por reconhecer-se como "protagonista" de seu processo, ou, agente ativo de seu próprio destino.

Moreno estabeleceu uma relação entre a existência humana e o “drama” representado por múltiplos atores (atores representados pela mesma pessoa – pai, filho, irmão, marido, etc...) , cujo enredo é, para eles, sempre inconsciente. Aqui convém ressaltar que o significado grego para a palavra "drama", é "paradoxo, conflito". Ou seja, no teatro, um drama conta a história de um "paradoxo/conflito" terrível, vivido pelo personagem principal (protagonista). No drama, esse conflito pode existir por uma falha moral ou, pela incapacidade desse personagem principal, em lidar com as circunstâncias desfavoráveis. Para Moreno, “Somente a revelação do drama interno, pode transformar a existência”.

O trabalho psicodramático costuma ocorrer em três contextos básicos de realidade: social, grupal e dramático. A atuação dos participantes se dá através do desempenho dos papéis que emergem naturalmente da dinâmica grupal. Isso significa que são “papéis” que sempre trazem questões da vida cotidiana dos participantes do grupo e da forma como se sentem atingidos, naquele momento. Cada pessoa representa normalmente em seu dia-a-dia, uma infinidade de papéis, tendo dentro de si, uma infinidade de “atores” que os representam. Os papéis que são representados nas sessões de terapia são sempre os papéis que de alguma forma já são representados em sua vida cotidiana. "O papel é a forma de funcionamento que o indivíduo assume no momento específico em que reage a uma situação específica, na qual outras pessoas ou objetos estão envolvidos" (Lições de Psicodrama - Ágora Editora - 7ª edição - Gonçalves, Salles, Camila; Wolff, Roberto Wilson; Almeida, Castello, Wilson).

GRUPO
A formação de um Grupo Terapêutico gera o “contexto grupal”, formado pelo vínculo que é comum aos integrantes de um grupo de psicoterapia: os motivos que a levaram a fazer terapia – suas queixas e o significado dessas "queixas". Torna-se um lugar onde os sujeitos mostram as suas diferenças e pluralidades, podendo compartilhá-las. No contexto dramático, emergirá o produto do protagonista, através de cenas repletas de significados, tal como a realidade. Nesse contexto existem cinco instrumentos considerados fundamentais: protagonista (paciente ou grupo), cenário (lugar onde se realiza a dramatização), ego auxiliar (um importante assistente do diretor), psicoterapeuta (diretor) e platéia (sempre formada por pessoas ligadas ao contexto grupal).
As intervenções no grupo psicodramático giram em torno da idéia da espontaneidade e da criatividade, como uma forma de se remeter aos atos de nascimento e renascimento: emocionais, afetivos, conativos e relacionais.

O MODELO TRADICIONAL E O PSICODRAMA
Vou procurar demonstrar o que disse acima, dando um exemplo simples da forma como as pessoas normalmente buscam ajuda especializada. O comportamento mais comum tem implícito um desejo muito corriqueiro: o desejo de procurar um profissional renomado, que cobre um preço que possa ser pago e, que “resolva” o “meu problema”. Explicando melhor: a pessoa que procurou algum tipo de ajuda, acredita que a solução de seu problema (que é só um pequeno pedaço da sua “verdade”), não depende de si mesma, mas de outra pessoa (o médico ou o psicólogo, etc.). Essa fantasia ocorre por haver um reconhecimento prévio de que esse profissional escolhido tem todo o conhecimento necessário para resolver “o meu” problema. Vamos deixar claro que é óbvio que o psicólogo ou outro profissional de saúde tenham que estar muito mais preparados para ajudar as pessoas a resolverem suas dificuldades, do que uma pessoa que não tenha estudado e feito práticas para esse fim. E também é natural que essa diferenciação coloque esse profissional num lugar de destaque, na relação com seu cliente. Mas se prestarmos atenção, essa simples ação revela dois importantes enganos: 1) a de que o “meu problema” não é mais “meu problema”, porque eu o tercerizei para alguém muito competente; 2) a partir dessa terceirização, permito que uma outra pessoa, seja a protagonista do meu processo pessoal de “cura”, passando a responsabilidade que deveria ser só minha, para ela.

Existem alguns exemplos que a maioria das pessoas já vivenciou que podem ilustrar o que foi dito aqui: “Dr. Fulano é um ótimo cirurgião! Salvou a vida de Cicrano! Mas é um grosso! Não fala adequadamente com a família sobre os desdobramentos da recuperação; ...Eu disse para o Dr. Fulano que esses remédios me fazem mal, mas ele ficou bravo e disse que isso é coisa da minha cabeça, me mandando continuar a tomá-los; Não consigo fazer a dieta que Dr. Fulano me prescreveu e ele me disse que se não emagrecer, nem adianta voltar...; Dr. Fulano disse que a solução de meu problema é dormir em um quarto arejado, sem mofo e sem barulho. Mas eu fiquei com vergonha de dizer que moro na favela...; Minha consulta demorou 10 minutos e o médico nem olhou na minha cara”; Quero ouvir que conselhos o meu psicólogo vai me dar, para sair dessa enrrascada..." Vejam que não adianta dizer: “você tem que emagrecer... ou durma em um ambiente tranqüilo”, se o paciente tem dificuldade em não comer em excesso ou more em um lugar onde é impossível se ter um quarto de dormir tranqüilo. Da mesma forma, nenhum psicólogo que se preze, tem o dever e a responsabilidade de “dar conselhos” de “como se deve agir” em determinadas situações.

O psicodrama e a atividade com grupos se diferenciam do modelo tradicional de saúde, por procurar apresentar uma proposta chamada por Moreno de "totalizadora". Proposta totalizadora para o psicodrama significa trazer elementos biológicos, psicológicos e sociais, num mesmo tempo, aqui e agora, através do próprio indivíduo e, não de terceiros. Dessa forma ele passa a ser o protagonista de seu processo, e também a assumir a responsabilidade que lhe compete. Por essa razão sua premissa não é o "sintoma", que embora seja muito importante e também um “ponto de partida”, é apenas um recorte da “verdade” de uma pessoa. É impossível conhecer “toda a verdade”, de alguém. Nessa visão, não só a “doença” deve ser compartilhada pelo cliente. Mas também o “tratamento”. E neste sentido o psicodrama se encaixa de maneira muito precisa com a clínica interdisciplinar, convidando outros profissionais (médicos, dentistas, fisioterapeutas, etc) a comporem o processo do cliente, sempre que isso for necessário, mas sem que lhe retirem o “papel” de “protagonista”.

A premissa do psicodrama é o “encontro”, onde os indivíduos têm a oportunidade de falar de si e dos outros, buscando vivenciar essas experiências através da dramatização e do compartilhamento. Esses elementos básicos são facilitadores para o surgimento da espontaneidade e da criatividade, como forças transformadoras da “realidade” desse indivíduo, com ele sendo o único e mais importante "responsável".
Lembro-me de um atendimento que fiz no ambulatório do sono do Hospital São Paulo, em que a uma paciente de 17 anos apresentava um importante quadro de insônia, causada por alterações em seu ciclo “sono-vigília” (ciclo circadiano) e, principalmente, por uma péssima “higiene de sono” (higiene de sono é a expressão que resume uma série de medidas e comportamentos preventivos, que tem por finalidade facilitar uma boa noite de sono). Tratava-se de uma paciente em que seu diagnóstico já havia sido feito pela equipe médica, mas ela sempre retornava ao hospital com a mesma queixa. Nos atendimentos era perceptível que seus hábitos e costumes haviam mudado muito pouco, e que seu quarto de dormir ainda resumia-se a um pequeno cômodo, na entrada do barraco em que vivia. Ou seja, não havia muito que se fazer... O problema que a paciente apresentava estava esclarecido, mas a solução parecia impossível, em função de sua realidade cotidiana permanecer a mesma. Ocorre que durante uma dramatização, onde a pequena sala de atendimento do ambulatório era o “cenário”, a paciente passou a enxergar e dar possíveis soluções para modificar a “realidade” de seu quarto de dormir. Suas dificuldades foram compartilhadas e permitiram o surgimento de soluções e idéias, espontâneas e criativas, que nunca lhe haviam ocorrido, antes. Acompanhei essa paciente por pelo menos um ano e sou testemunha da incrível melhora de sua qualidade de sono.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Ronco e Apnéia Obstrutiva do Sono (SAOS)

Não é raro pessoas me procurarem para fazer psicoterapia com queixas de insônia, depressão, sinais de impotência e problemas conjugais e profissionais generalizados. Em alguns casos, após uma boa entrevista inicial, surgem evidências muito sugestivas de que a origem de tais problemas não está totalmente calcada em problemas e dificuldades emocionais. A pessoa apresenta sintomas semelhantes a alguém que não dormiu: sente-se sem energia, com baixa libido e muito embotada. Mas a causa desses sintomas pode estar associada não a insônia ou a depressão, e sim a apnéia do sono. A palavra “apnéia” vem do grego e significa “vontade de respirar”.

Ronco e apnéia estão associados aos "distúrbios respiratórios ligados ao sono" e basicamente ocorrem por algum tipo de obstrução das vias respiratórias. Quando a obstrução é total (SAOS - síndrome da apnéia obstrutiva do sono), a respiração cessa totalmente por 10 ou mais segundos, devido ao colabamento da via respiratoria. Quando a obstrução é parcial (SARVAS - síndrome do aumento da resistência da via aérea superior), ocorre o consequente aumento do esforço respiratório causando o ruído que chamamos de ronco. Outros problemas de origem neurológica e não obstrutiva, também podem causar a cessação da respiração. Nesses casos o quadro clínico é chamado de Apnéia Central.

O ronco (SARVAS) é um evento muito comum em que a maioria das pessoas já teve algum tipo de contato. Não é raro alguém já ter ouvido o ronco de outras pessoas dormindo em salas de espera, aviões, etc. Já a apnéia, é mais rara de ser presenciada dessa forma. Os depoimentos mais assertivos são dados por cônjuges ou familiares que dormem no mesmo quarto e podem ser testemunhas de eventos que envolvam o parceiro ou algum outro membro da família. Há casos em que o parceiro(a) se vê obrigado a mudar de quarto para conseguir dormir. Este é um fator social negativo que quase sempre é capaz de gerar prejuízos emocionais e de convivência.

O índice de prevalência (percentual da quantidade de pessoas afetadas na população geral) da apnéia do sono, gira entre 2% e 5%, com predominância na população entre 30 e 60 anos. A incidência desse distúrbio aumenta com a idade e também é predominante no sexo masculino. Distúrbios respiratórios do sono estão diretamente associados ao aumento do número de despertares durante o sono, impedindo a seqüência natural do sono restaurador. Devido à dificuldade em respirar, a pessoa acaba "despertando" várias vezes durante a noite, não permitindo que o sono ocorra sem interrupções e com qualidade. Esses "pequenos despertares" chamados tecnicamente de"microdespertares", normalmente ocorrem sem que a pessoa tenha consciência e lembrança de que acordou muitas vezes, para “normalizar” sua respiração. Isso tem o mesmo efeito que os "cutucões" que são dados pelos parceiros de cama, em pessoas que estão roncando muito alto. Com o "cutucão", a pessoa tem um "microdespertar" e para de roncar, normalizando a respiração. Assim que volta a dormir e relaxar, o ronco reaparece.
Como resultado há uma importante diminuição da qualidade de vida e do bem-estar. Os sintomas mais comuns: Sonolência excessiva diurna (SED)- embora a pessoa tenha passado de 8 a 10 horas na cama, sente-se muito cansada durante o dia, com necessidade de cochilar muitas vezes, sem ânimo e energia para quaisquer atividades. Muitas das causas de acidentes no trabalho, no trânsito e domésticos, podem estar associadas, em função das capacidades de atenção, memória e concentração sofrerem uma drástica diminuição. Outros problemas de natureza fisiológica também estão associados: alterações do metabolismo, obesidade, hipertensão arterial, diminuição da libido, impotência sexual, surgimento de quadros depressivos entre outros. Não é raro a depressão diminuir ou ser vencida, após o tratamento adequado da apnéia. A pessoa reconquista a vitalidade e a vontade de viver.

A avaliação clínica desses distúrbios deve ser feita por um médico especializado no sono, e também através de exames complementares, em especial a PSG (polissonografia), de acordo com a necessidade que o médico indicar para cada caso. A partir da avaliação correta e segura, o tratamento é planejado de forma a garantir o procedimento mais adequado para cada pessoa, levando em conta o estado da saúde geral do paciente e também a relação com outras doenças que podem ser secundárias ou não, à apnéia.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Julie&Júlia

Recentemente tive o imenso prazer em assistir Julie&Julia (Meryl Streep é Julia Child e Amy Adams é Julie Powell - Direção: Nora Ephron; Roteiro: Julie Powell (livro), Alex Prud'homme (livro), Nora Ephron (roteiro), Julia Child (livro); Gênero: Biografia/Comédia/Drama/Romance; Duração: 123 minutos; EUA/2009).


O filme foi baseado em duas histórias reais que ocorreram em tempos diferentes: A primeira história é de Julia Child, pseudônimo de Julia Carolyn McWilliams (Pasadena, 15 de agosto de 1912 — Santa Bárbara, 13 de agosto de 2004) que foi uma autora de livros de culinária e apresentadora de televisão americana. Child aprendeu a cozinhar a partir de 1948 (período em que morou em Paris com seu marido Paul Child (Stanley Tucci) adido cultural americano, em missão na capital francesa) Entediada com a vida que levava, procurou entretenimento com os cursos considerados mais comuns e recomendados para as donas de casa da época (construção de chapéus, corte e costura, decoração, etc). Contrariando as expectativas da época, acabou optando por estudar e se formar na renomada escola de culinária "Le Cordon Bleu", um curso que nessa época costumava ser frequentado somente por homens. Embora contasse com o apoio incondicional de seu marido Paul (um homem que de certa forma também estava a frente de seu tempo), Child encontrava resistências da diretora do curso (seu maior desafeto) e de seus colegas de sala de aula (todos homens). Seu objetivo era criar um livro de receitas para todas as americanas que não contassem com os serviços de uma cozinheira, ou seja, pessoas comuns.

A segunda história é de Julie Powell e se passa em Nova York em 2002. Powell, então com 30 anos, é uma pretensa escritora e funcionária pública que resolve combater o tédio com a publicação diária, através de um blog, das receitas do livro de Julia Child. Seu compromisso era o de preparar a receita e depois divulgá-la, durante 1 ano (365 dias). Como o número de receitas era de 524, isso significava o incrível desafio de cozinhar e publicar, mais de uma receita por dia. Powell, como Child, também possuia um rol de amizades incompatível com sua busca por um novo caminho, uma nova vida. Outra semelhança entre as duas, foi o apoio incodicional de seu marido (Cris Messina como Eric Powell). Eric valorizava e compreendia a angústia de Powell, exatamente como Paul em relação a Child. embora tenham vivido em décadas muito diferentes.

Alem da deliciosa forma como o filme foi concebido e desenvolvido, a trilha sonora fantástica e a interpretação maravilhosa de Meryl Streep, fui muito tocado por questões que têm estado muito presentes em meu consultório e em muitas reuniões de amigos cinquentões: a eterna busca em identificar a missão individual/vocação e a coragem em dizer “não” aos sistemas maiores que costumam reger nossos destinos.

O filme revela a angústia e o descontentamento de duas mulheres que viveram em tempos diferentes, e a deliciosa forma como decidiram lidar com esses sentimentos, tornando-os públicos (diziam a todos sobre seu descontentamento), enfrentando-os e transformando-os! As armas que puderam utilizar: a espontaneidade e a criatividade através de ações cotidianas simples, que estavam ao seu alcance de seus braços. Mudaram suas vidas e ao mesmo tempo as vidas de milhares de pessoas. Produziram respostas novas para questões muito antigas ampliando seu repertório individual e também o repertório coletivo, de milhares de mulheres "sem cozinheira".